A propósito de "PELA RURALIDADE"
Leio este texto e as minhas memórias recuam até à aldeia de Cabeçais, freguesia de Fermedo, concelho de Arouca. Tive a felicidade de ter ali avós e tios maternos. Tive o privilégio de ir sozinho na carreira da Auto-Viação Feirense que saía da Rua de Cimo de Vila e parava no largo da feira, onde já me esperava a avó e a tia, passar muitas férias escolares. Embora o cobrador ficasse responsável por mim perante a minha mãe, eu portava-me bem, entretido a ver a paisagem, sentadinho no meu assento ainda sem cinto de segurança. Levava na sacola alguns postais dos Correios, que tinha de escrever aos meus pais, espaçadamente, e assim desenvolvi, como agora se diz, hábitos de escrita. Também não tinha internet, nem aparelhos digitais que me ocupassem o tempo. Tinha era muita natureza desconhecida para desbravar. Umas vezes sozinho, outras a acompanhar a minha avó a levar o comer à pedreira onde o meu avó trabalhava. A cem metros da casa da minha avó existia a Casa Nova, da qual eu era visita, pois era o menino da cidade. Era do Sr. Norberto, casado com a D.ª Leonor, com um filho, o Zé Luís, mais velho do que eu. O Sr. Norberto era sócio da Feirense e tinha um caseiro que era o Sr. José. Foi com este que fiz muitas viagens de ida e volta até aos campos que fazia, no chamado carro de bois. Numa das primeiras viagens de regresso, apanhei um valente susto, ou melhor, apanhei um verdadeiro cagaço, embora não me tivesse borrado. Ia o carro cheio com um carregamento de canas de milho sem espiga e suas folhas, quando o Sr. José me perguntou se eu queria ir lá em cima, sentado ou deitado. Aceitei o convite. Tinha uma vista privilegiada. Distraí-me tanto a ver a paisagem que não dei pela saída do Sr. José. Não me lembrava de o ter ouvido despedir-se. O carro continuava a ser puxado pelos bois castanhos. Lembro-me até que um deles dava pelo nome de Castanho. Eu bem olhava na direção de todos os pontos cardeais e colaterais mas não via o Sr. José da Casa Nova. Oh meu Deus... E agora? Ele deixou-me aqui ficar sozinho. Só respirei de alívio quando consegui ver a Casa Nova lá ao fundo do caminho. Devo ter chegado tão branco ao destino que o Sr. José comentou:
- Ó Francisco, não me digas que vinhas com medo...
Muito obrigado, meu caro António. Abraço.