Quando os lobos uivam
Vamos por aqui continuando a relembrar o manancial prosaico de Aquilino Ribeiro, a cultura é sempre uma mais valia. O título deste post nada tem a ver com os predadores dos ovinos e caprinos, vacas e asnos também como no passado nunca se tinha visto, foi um romance que pôs em alvoroço as forças repressivas salazaristas, cujas edições foram proibidas. O regime de Salazar não admitia críticas mesmo as encapotadas.
Na actualidade os lobos uivam, ou melhor andam sorrateiros às caçadas, por outras razões. Regressando ao meu tempo de jovem os lobos eram mal queridos, odiados, pois a cada passo surripiavam gado miúdo, leia-se ovinos e caprinos, aos lavradores. Durante décadas os larápios eclipsaram-se. Apenas de vez em quando os naturalistas lamentavam-se que a raça estava em vias de extinção, eram precisas medidas para inverter a situação.
Bem, chegamos agora e os média referem ataques dos lobos aos gados no Montemuro, Gerês, Pinhel e mais, cito de memória. Então uma varinha mágica fez nascer lobos pelas serras!... Os serviços da conservação da natureza não abrem jogo, mas tudo indica, segundo o povo, que foram “botados”. Numa pesquisa na NET há uma herdade na região de Mafra onde estes animais são criados, Centro de recuperação do lobo ibérico.
Era eu um petiz, recordo-me andar lá pela terra um serrano com a carcaça dum carnívoro, ou seria só a samarra, às costas a pedir ajuda por façanha tão do agrado dos pobres lavradores.
Sobre isto passo a citar Manuel de Lima Bastos referindo-se ao livro de Aquilino “Quando ao Gavião Cai a Pena, obra de 1935, diz:
“Era hábito antigo exibir o lobo por quanto povoado montesinho houvesse para recolher as esmolas de preceito que ninguém regateava, as quais rendiam ao afortunado abatedor da fera grossa tanto em maquia tanto em dinheiro como em géneros de boca. António das Arábias apressou-se a preparar o andor onde o bicho seria exibido para logo sair em procissão e iniciar-se a rendosa colecta. Improvisaram umas andas com duas varas de pinheiro e deitaram a fera em cima. O António das Arábias fez de pároco e rezou-lhe o de profundis:
Este lobo não ia à missa,
Nem à missa, nem ao sermão;
Comia cabra à sexta-feira,
Não tem absolvição.
Logo rompia, em cantochão, o coro dos acompanhantes que engrossava à medida que se incorporavam mais e mais fiéis de quantos lugarejos vizinhos havia para ajudar ao responso do defunto.”
Eu sei que é uma tarefa assaz intrincada, o equilíbrio entre a preservação da espécie e os legítimos interesses das populações do interior. E todos sabemos como o estado foge com o rabo à seringa, paga tarde e mal os prejuízos feitos pelo predador, além de pôr uma série de condições aos utentes do gado, cão de guarda por cada 50 animais ou tê-los a pastar em locais confinados.
Ant.Gonç. (antonio)