Olhar o Porto - LXX (O deserto)
Eu fui à cidade à noite na semana passada. Há quarenta anos quando se dizia, vou à cidade, era sabido que a referência era a cidade do Porto, não só em toda a área metropolitana como até em terras distantes como Marco, Baião e até Cinfães apesar de pertencer ao distrito de Viseu. Agora há por aí cidades a dar com um pau, só o concelho de Gondomar tem três: Gondomar, Rio Tinto e Valbom. E estão sempre a fabricar mais, as notícias de ontem davam a criação de mais cinco, entre elas a Senhora da Hora. Bem, mas eu vou mantendo as minhas referências ancestrais, fui mesmo à cidade.
Alguém amigo me telefonou a dizer que à noite ia haver, no Ateneu uma sessão de apresentação dum livro dum poeta falecido precocemente, filho duma colega com quem trabalhei durante muitos anos. Lá fui e comprei o livro que ainda não li com atenção mas parece-me de leitura um bocado difícil para mim. Tenho ideia que os poetas manifestam as suas ideias duma maneira profunda que nos exige um esforço para entender o seu alcance que está à frente do comum dos mortais.
Aproveitei então no final para dar uma volta pelo centro da cidade, ver com os meus próprios olhos a nostalgia que invade o Porto à noite. Dos meus tempos de jovem guardo aquele sentimento que havia nas famílias para ir tomar um café à Baixa e ver as montras. Hoje o que se observa é desolador. Não há gente e alguma que se vê será um ou outro fugaz como eu, e pessoal da pesada ou os sem abrigo que começam àquela hora nos portais de casas falidas a fazer o ninho. Quanto a segurança nem é bom falar, não se vê uma farda!... Ficamos pela consolação que ainda somos um país de brandos costumes?
Somos saudosistas dum outro tempo, pois somos, quando a cidade mexia à noite. Sinais dos tempos!...
Fiquem bem, antonio