O ano já ia a meio e a turma “G” que era constituída maioritariamente por estudantes do sexo masculino tinha aula de Pedagogia. Eleutério Correia de Melo, um açoriano que assentou arraiais com a sua avantajada prole na cidade do Porto, morava na Rua do Bonjardim, era o Director da Escola do Magistério já há longos anos. Frequentador assíduo do Café Pereira no Marquês. Pessoa culta segundo se dizia, tinha dificuldades de visão, usava óculos com lentes grossas, era também professor de Pedagogia. Em plena sala da aula estava a debitar a matéria certamente à volta de Pestallozi, quando bateram à porta pedindo licença para entrar. Era a empregada chefe, Senhora D. Olívia. - Sr. Director dá-me licença? - Faça favor de entrar. - O senhor agente X da Direcção Geral de Segurança (antiga PIDE) solicita a presença do Senhor Director ao telefone. E lá foi apressado com forte estatura, atender o senhor agente enquanto os alunos ficaram na sala por largo tempo na cowboiada. Era sabido que na altura a DGS tinha os movimentos estudantis debaixo de olho e neste caso fica-nos a incógnita do teor de tal telefonema – a EMPPorto não tinha tradição de insurreições académicas. Seria certamente para fazer o ponto da situação se estava tudo sob controle, podemos agora especular.
Viver o presente com um olhar no passado, é bom, antonio
Ó António! O que tu me foste lembrar: as célebres sessões de lerpinha nos intervalos das aulas. Eu acho que isto é digno de ser recordado, não é? Devo começar por dizer que os estabelecimentos de ensino de hoje têm (e ainda bem) todas os serviços que os utentes precisam: cantina, bar ou bufete, sala de estar ou de convívio, reprografia, etc, etc. É evidente que os mais novos interrogar-se-ão, neste momento, se alguma vez existiu alguma escola sem estes serviços. Pois, com um pouco de esforço imaginativo é capaz de se conseguir algum paralelismo. Assim, para começar pelo fim, podemos dizer que o serviço de reprografia funcionava no vestiário masculino. Mas é bom que se diga que estamos a falar da máquina de stencil e do tabuleiro de gelatina. A sala de estar e de convívio dos rapazes funcionava no mesmo vestiário. Dos rapazes? Sim, porque nada de misturas, pois embora houvesse uma única turma mista, a escola tinha porta de entrada e vestiários de meninas, de rapazes e de professores. O bar ou bufete era igualmente no mesmo vestiário. A cantina, essa era repartida pelo Marques da Alegria, pelo Café Corsário e pela Confeitaria Porto Santo. Quanto ao vestiário dos rapazes, que também funcionava de oficina de pequenas reparações, esse é que era o covil do lobo, esse é que me fez escrever esta espécie de crónica pois era aí que, nos intervalos das aulas, as sessões de lerpinha se desenrolavam. É evidente que não havia pano verde e que todos «casavam» a crouinha (os 50 centavos) da época ou quando era um a «casar» por todos, acho que se começava pela moedinha de 5 coroas (25 tostões ou 2$50). Mas destes valores saberá melhor o António. Eu só sei que me lembro dum célebre chapéu do carpinteiro. As sessões eram sempre muito acaloradas e até parece que os rapazes não podiam aproveitar os intervalos para conviver com tanta rapariga que por ali andava! É impressionante!
Andava ainda na EMPPorto e então também decidi entrar para o Instituto Comercial que ficava na altura na Rua Entreparedes. Para isso era obrigatório um exame de admissão que englobava matérias para as quais não estava familiarizado nomeadamente Físico-químicas.
Então inscrevi-me numa sala de estudos na Rua de Santa Catarina mesmo em frente ao Hotel do Porto. Era seu dono e também explicador, Ribas, um maduro porreiro que franqueava as portas do salão ao maralhal a qualquer hora, até nos dava a chave. Mais tarde vim a encontra-lo no Instituto Comercial pois andava ainda a acabar o curso.
Certa noite aproveitando a bonomia de Ribas, um grupo de lerpistas entre eles os cinfanenses nos quais me incluo entreteve-se por lá até às tantas da matina. Na saída cada um desenfiou-se para seu lado sempre a espreitar se havia por perto alguma farda (sim, porque na altura havia policia de ronda nocturna, agora nem de dia) que nos podia tomar por assaltantes, ou pelo menos teríamos de justificar a presença àquela hora e naquele sítio. Parece que tudo correu bem e daí resta-nos a memória dum tempo que já foi!...
Estas efemérides são, realmente, o que são e ponto final. É, no mínimo, discutível que haja, hoje em dia, um dia para tudo e mais alguma coisa. Todavia, se há organização ou organismo que mereça ser falado e «trabalhado» com todos mas muito principalmente com os mais novos é a Protecção Civil. É o que eu acho. Se estivesse no activo, era assunto que não deixaria de ser por mim abordado e aproveitado até à exaustão. E muito pano para mangas havia aqui neste tema... Mesmo retirado, tratei de o trabalhar com quem achei que devia. O que me custa mesmo entender é o facto de ter lido o JN de hoje, dia da efeméride, e não ter lá visto qualquer referência. Passou-me derpercebida? Ai não é notícia? E na rádio? E na tv? Também não ouvi qualquer referência. Ando distraído?
Quando era estudante só havia recolha de lixo doméstico, nas cidades, porta a porta e não havia contentores. Actualmente até pelas aldeias mais recônditas há este serviço. A sociedade consumista de desperdício, usar e deitar fora, assim o exige por um lado mas por outro também o nível cultural baixo do nosso povo não ajuda nada. Saber colocar o lixo nos locais adequados é uma questão candente que devia começar nos bancos da escola com uma nova disciplina, digo eu – o ambiente. A bandalheira que a imagem degradante nos mostra é bem o retrato deste problema que cada vez mais nos deve preocupar. Na noite de Carnaval estes contentores que ficam perto da minha residência, utilizo-os com frequência, foram simplesmente destruídos pegando-lhes o fogo. Portugal é um país de brandos costumes, diz-se. Sem querermos ter como bandeira de referência a China atrevemo-nos a dizer que nesse país estes casos não acontecem. Lá é a doer! Como estamos longe, também no ambiente, dos nossos parceiros europeus!...