Pela ruralidade
Embora me considere um citadino de meia costela, gosto de vez em quando dar uma saltada até à aldeia das minhas raízes, que fica entre Douro e Paiva, onde tenho então a outra meia. As memórias dos caminhos, das casas, dos campos, dos montes e sobretudo das pessoas são-me familiares e cada passo que por lá dou faz-me recuar uns anitos e sentir todo o bulício campestre, agora tudo parado num marasmo ensurdecedor devido também à globalização. No meu subconsciente ainda paira o cheiro a estrume espalhado nos campos que não tinha a agressividade do odor fétido de águas poluídas que a céu aberto jorram para o Rio Douro na actualidade.
Por aqui ou ali, no monte ou no campo gosto de sentir o marulhar da folhagem, o chilrear da cerejina e o cantar da água cristalina na levada no meio de todo aquele silêncio divino-sepulcral. É aqui que os poetas enchem o peito para depois expirarem nos poemas toda esta frescura da natureza. Como eu gostava de ser poeta, ou antes, saber escrever poesia!...
Manadas de gado tangido por moços boieiros para a feira quinzenal de Nespereira, tudo a penantes por caminhos travessos, davam um ar buliçoso à minha aldeia embora a feira ainda ficasse a três quilómetros de distância! E que dizer de manadas de vitelos que vinham da feira do Marco de Canavezes para o matadouro do Porto, a boots pois claro, encaminhados por tangedores (mais uma profissão extinta). Felizmente ainda há memórias vivas que nos recordam esse tempo. A minha sogra de 89 anos, ainda de cabeça fresca, é uma dessas testemunhas. Quem geograficamente conhece a distância entre o Marco e o Porto pode tirar daí ilações sobre a vida daquela época.
Era o Portugal agrícola que fervia entre fronteiras cerradas, com o lema do mais produzir é que está o ganho.
Campos, leiras e leirinhas, pequenos quelhos, tudo era fabricado com a ajuda do gado vacum quer nas lavras ou transportes nos carros. A imagem do canastro, que acompanha este post, implantado sobre um caminho público para não ocupar espaço no terreno lavradio é bem a constatação do aproveitamento até ao tutano da terra.
O trabalho na agricultura era de sol a sol ou mesmo antes do sol nascer (ver minha crónica http://magisterio6971.blogs.sapo.pt/127836.html, neste blog). Gente que labutava arduamente e espelhava uma alegria de viver que nos dias de hoje não acontece.
Eu pessoalmente curvo-me perante toda essa gente do Portugal rural da minha juventude
Viver o presente, olhando para o passado dá-nos ânimo para seguirmos em frente, antonio